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Roteiros da Jornada do Patrimônio buscam olhar mais desperto sobre SP

Adriana Terra

14/08/2018 16h17

Em São Paulo, toda nova obra já nasce ruína. Uma cidade em que chama a atenção a falência de seus projetos urbanos, bem como as tensões em sua urbanização. É nessa cidade que se faz essencial a marcação do que foi invisibilizado ou não teve tanto destaque assim: do Morro do Querosene aos percursos guiados pelos passos da capoeira, dos letreiros dos prédios de Artacho Jurado até a importância feminina na construção do espaço, passando pela história de um arquiteto negro em uma cidade escravocrata.

Vila Itororó (saiba como visitar durante a Jornada). Foto: Sylvia Masini

Costurei nesse comecinho de texto temas de alguns dos 100 roteiros que estão na Jornada do Patrimônio, que ocorre neste fim de semana (18 e 19/8) na capital paulista. Em sua 4ª edição e com 320 atividades, a maioria pensada por coletivos autônomos e selecionada via chamada aberta, o evento tem como tema "Uma Cidade, Muitas Mãos". A intenção é avançar na noção de patrimônios imateriais, pensando a pluralidade de identidades que construíram e constrõem a cidade.

"Até os anos 1980 a gente teve uma política voltada para 'pedra e cal'. A partir de então que começa a surgir uma ideia de preservação do patrimônio imaterial. E a gente sentiu que ele acabava aparecendo muito pouco na Jornada", diz Mariana Rolim, diretora do Departamento de Patrimônio Histórico da Prefeitura de São Paulo. "A ideia foi justamente começar a jogar luz nele."

Ela explica que a convocatória aberta tem a ver com essa proposta, abrindo para que as pessoas contem histórias diversas. Mariana destaca ainda a importância de, por meio desse formato, mapear projetos que estão pensando a cidade e por vezes ficam fora do radar de políticas públicas, seja por questões burocráticas ou estruturais.

Com uma programação gratuita que inclui ainda oficinas (tem de crônica a história da dança paulista, "dos Guaranis aos b-boys"), palestras, lançamentos de livros e visitação de construções históricas, o blog destaca 15 roteiros que dialogam com os movimentos da cidade — e que são boas oportunidades para se deslocar a pé por São Paulo. 

Arquitetura e Personagens da Belle Époque: Tensões na Urbanização de São Paulo
"A proposta deste roteiro envolve um passeio pelas ruas da região central de São Paulo, para que, com base na seleção de edifícios remanescentes do começo do século 20, comecemos a pensar a história da arquitetura e do urbanismo como um processo de tensões e interesses", diz a descrição do percurso. Saída do Pátio do Colégio no domingo (19) às 10h30.

Ausência e presença da memória negra em SP – "O que se fez dos espaços históricos de resistência da população negra? Que memórias foram construídas para 'substituir' estas?", questiona o roteiro organizado pelo coletivo História da Disputa, marcado para sábado (18) pela manhã com saída da estação Liberdade do metrô.

Em São Paulo, toda nova obra já nasce ruína – "Tendo como disparador o livro 'Cidades Invisíveis', do Ítalo Calvino, o roteiro se propõe a caminhar pelo triângulo histórico (…) pensando que São Paulo se molda pelo descontrole de seu próprio espaço", explicam os organizadores do percurso. Que cidade é construída na falência de seus projetos urbanos? O roteiro está marcado para domingo às 15h com saída do Pátio do Colégio.

Letreiros dos prédios de Artacho Jurado – O arquiteto que não era arquiteto é famoso pelos edifícios imensos erguidos na região central da cidade, mas este roteiro vai destacar outra habilidade desse personagem. "Antes de tornar-se um famoso empreendedor da construção civil, Jurado desenvolveu trabalhos como letrista, atividade que o levou à execução de placas publicitárias e posteriormente, ao desenvolvimento de cartazes e displays promocionais". Organizado pelo coletivo Tipos Paulistanos, ele sai sábado às 10h30 da rua General Jardim.

Edifício Parque das Hortências. Foto: Sylvia Masini

Morro do Querosene – Boa oportunidade para conhecer essa região da cidade marcada pela migração nordestina de forma guiada, com presença de músicos como Dinho Nascimento (baiano que fez parte do grupo Arembepe e hoje vive no bairro). O roteiro parte do Sesc Pinheiros no sábado às 14h.

O Sagrado e o profano no outeiro da Penha – "O roteiro de caminhada por Penha de França, um dos bairros mais antigos do município de São Paulo, localizado na zona leste, é uma forma de apreciar, descobrir e entender a arquitetura e estilo do lugar", diz o descritivo do percurso que parte do Centro Cultural da Penha no sábado às 10h.

Passado e Presente: conexões nos trilhos da CPTM – Para os interessados em entender a cidade pela sua malha ferroviária, este é o roteiro. Parte da estação da Luz no sábado às 8h30.

Pelos passos da Capoeira em São Paulo – Entender São Paulo pelo percurso de grandes mestres capoeiristas que cultivaram tradições afro-brasileiras na cidade é o mote deste roteiro que parte do Sesc São Caetano às 9h do domingo.

Roupas, edifícios e migrações: a história do polo têxtil do Bom Retiro – "O percurso contará a história do polo têxtil do Bom Retiro, responsável por aproximadamente 55% da produção de moda feminina brasileira (…) O itinerário é estruturado a partir da atuação das comunidades imigrantes mais importantes na atuação do polo, cada uma a sua maneira e a sua época: italiana, judaica, coreana e boliviana", explicam os organizadores. O roteiro sai da estação da Luz e ocorre no sábado e no domingo.

Mariana Rolim atenta ainda para um roteiro que fala sobre as zonas de prostituição na região, interessante para pensar a estrutura das construções do bairro.

São Paulo pelas mãos femininas – "O roteiro propõe um passeio a pé sob o ponto de vista de mulheres que deixaram suas digitais, ora lutando, ora transgredindo e ora transformando hábitos e costumes", explica o descritivo do passeio que parte do Solar da Marquesa no sábado às 10h.

São Paulo, sua gente, seus rios – Onde estão os rios de São Paulo? Este roteiro fala sobre a questão hidrográfica na cidade, partindo do Pátio do Colégio às 10h do domingo. Há ainda outro roteiro sobre rios, enfocando no Saracura da Bela Vista.

Saúde Pública na construção da memória paulistana – Instituto Butantan – "A atividade trata da história da saúde pública em São Paulo a partir dos espaços edificados do Instituto Butantan", explicam os organizadores. A atividade ocorre no sábado e no domingo.

Tebas: um negro arquiteto na São Paulo escravocrata – "O roteiro percorrerá as obras de Joaquim Pinto de Oliveira (1721-1811), apelidado de Tebas pelo povo do século 18", diz a descrição do roteiro. Tebas construiu a torre da antiga Igreja Matriz da Sé (1750) e a reformou 28 anos depois, ocasião em que conquistou a alforria, aos 57 anos de idade. O percurso sai do largo São Francisco no domingo às 15h.

Tecendo memórias: reminiscência da indústria têxtil e atuais dinâmicas urbanas na Mooca – Roteiro bom para conhecer as fábricas da região, como a da Alpargatas. Sai da Universidade Anhembi Morumbi no sábado às 14h.

Trilha Urbana – memórias e espaços públicos em Perus – "Zona de passagem de tropas militares durante o período colonial e Império, Perus, o bairro mais ao norte da cidade de São Paulo, foi também uma importante região mineradora. O roteiro aborda a história da região a partir da ocupação, revitalização e resignificação dos espaços públicos como lugares de encontro, das diversidades e diferenças", explica o descritivo do evento que parte do Sesc Santana às 10h do sábado.

Sobre a autora

Adriana Terra é jornalista e gosta de escrever sobre a cidade e sobre cultura. É co-criadora da série “Pequenos Picos”, mapeamento afetivo de comércios de bairro da capital paulista, e mestranda em Estudos Culturais na EACH-USP, onde pesquisa lugares e modos de vida. Foi criada em Caieiras e há 15 anos vive no centro de São Paulo. Na zona noroeste ou na Bela Vista, sempre que dá, prefere ir caminhando.

Sobre o blog

Dicas de lugares, roteiros, curiosidades sobre bairros, entrevistas com personagens da cidade, um pouquinho de arquitetura e mais experiências em São Paulo do ponto de vista de quem caminha.

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