Lembrando quem nos ensinou a andar pela cidade
Um amigo carioca comentou esses dias sobre o apreço que ele tem por certo bairro paulistano, e lembrou de quando ele vivia na cidade e foi parar pela primeira vez no lugar: a rua que virou, o boteco em que parou, o que viu ali. "Me senti muito à vontade".
Essa memória que a gente carrega dos cantos da cidade, que faz a gente enxergar os lugares cada qual de um jeito, vinculando uma arte em um muro a um momento da vida, uma dama da noite que perfuma um pedaço "feio" da via ao pensamento sobre algo melhor, uma composição de João Nogueira que nos emociona a uma cena de rua que o cérebro — cheio de nuances e subjetividades — registrou, essa memória sempre foi, para mim, uma maneira potente de reconhecer o que a cidade faz da gente e o que a gente faz dela.
É um jeito que me parece também muito bonito de lembrar quem nos ensinou a buscar sentido nesse emaranhado de paisagens, histórias, climas, sensações. Reconhecê-los. Toda vez que pego um trem, eu me lembro de, menina, ir fazer compras na Lapa com a minha avó. O sabor do Sonho de Valsa, por exemplo, não tem quem mude: sempre estará vinculado à promoção das lojas Americanas que a dona Holanda não perdia. A Lapa, por consequência, é território dela, da descida do trem até o comércio cheio na rua, passando pela sacolinha da Sumirê.
Já quando caminho na natureza, seja em qualquer área verde que sobreviva no espaço urbano, tenho outro guia. Quem me leva pelo braço é meu pai, insistindo que dá para descer aquela rampa (por mais íngreme que, em uma primeira vista, ela pareça), que se a gente for por determinado caminho a vista lá do alto vai ser linda, que a aventura urbana de estar junto na cidade é a melhor herança que se pode deixar.
Sinto que esses primeiros passos que a gente guarda na memória vão moldando quem somos, e também guiando a gente em todos os primeiros passos ao longo da vida. Nos educando para entender onde pisamos, para despertar sentidos e atenções, da primeira visita a um bairro ao primeiro olhar sobre uma cidade pela qual a gente acaba de se encantar — uma das minhas sensações favoritas. Aquilo que meu amigo se recordava bem sobre a São Paulo que é, também, um pedacinho dele.
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